O jantar inicial, narrado
em 8 capítulos, do livro de Thomas Mann: Os Buddenbrook, é a celebração do
apogeu econômico e social de uma família burguesa alemã. O livro é a saga de
sua decadência. Para este tipo de jantar
não podem faltar bons pratos, serviço impecável e boas bebidas. Além das
intrigas, ironias, preconceitos de classe, agressões sutis, porém, maliciosas,
conflitos por interesses financeiros, galanteios e a gula. E tudo termina com
cafés, licores e uma partida de bilhar, até a ruína bater à porta.
CARDÁPIO
A SOPA: Sopa quente de
legumes com pão torrado
BEBIDA: Vinho tinto; vinho
branco "C.F. Köppen"
ENTRÉE: Peixe
PRATO PRINCIPAL:
"Enorme presunto, cor de tijolo, defumado e cozido, acompanhado por um
molho de cebolinhas pardo e avinagrado. Junto seguia-se certa quantidade de verduras e legumes (brócolis, batatas etc.) e uma "Panela russa" - uma mistura de
frutas conservadas em álcool e de gosto picante.
SOBREMESA: Pudim de Pletten - uma construção de camadas
de macrones, framboesas, biscoitos e creme de ovos e pudim com molho de rum em
chamas.
BEBIDA: 3 garrafas de
vinho malvasia cor de ouro, velho e doce. Vindas da adega inteiramente cobertas
de pó e de teias de aranha
LE PLATEAU DE FROMAGES:
Manteiga, queijo e frutas
BEBIDAS: Café e licor
PARA INALAR: Charutos
TRECHOS DO TEXTO
"- Então, como
estamos todos com apetite, mesdames et
messieurs...
Ida Jungmann e a empregada
abriram os dois batentes da porta branca que dava para a sala de jantar.
Lentamente, num andar confiante, os convidados a transpuseram. Na casa dos
Buddenbrook podia-se contar com comida farta... p. 18
(...) com a ajuda de Ida e
da empregada da consulesa, do segundo
andar, acabara de servir a sopa quente de legumes e o pão torrado. As colheres,
cautelosamente, puseram-se em movimento. p. 22
(...) - Então, prezado
senhor cônsul - disse o Pastor Wunderlich com um sorriso prudente, vertendo
vinho tinto no seu copo e no vizinha -, então o senhor acha que, sem a
associação com Geelmaack e sem aquela sua conduta desenfreada, tudo teria
acontecido do mesmo modo? p. 24
(...) Lebrecht Kröger
replicou:
- não, senhoes, prefiro
agarra-me ao alegre presente.
Com gesto cauteloso e
elegante, empunhou o gargalo da garrafa de vinho branco em cuja rolha se erguia
um pequeno cervo de prata. Inclinando-a um pouquinho, olhou atentamente o
rótulo e leu o nome 'C. F. Köppen'. p. 24
(...) As empregadas
mudaram os prato se porcelana de Meissen, de bordas douradas. A Sra. Antoinette
não afastava os olhos delas, e Ida Jungmann gritou ordens pelo porta-voz que
ligava a sala de jantar com a cozinha. Sirva-se o peixe. p. 24
(...) Mudavam-se novamente
os pratos. Surgiu um enorme presunto, cor de tijolo, defumado e cozido,
acompanhado por um molho de cebolinhas pardo e avinagrado. Junto seguia-se tal
quantidade de legumes que todos os presentes teriam podido servi-se de uma
única travessa. Lebrecht Kröger encarregou-se do ofício de trinchar. Erguendo
levemente os cotovelos, estendeu os dedos indicadores pelas costas da faca e do
garfo e cortou com circunspeção as fatias macias. Servia-se também a 'panela
russa', obra prima da Consulesa Buddenbrook, uma mistura de frutas conservadas
em álcool e de gosto picante. p. 28
(...) - Por deus - disse
Hoffstede, arrumando no garfo uma porção
de presunto, brócolis e batatas, que enfiou na boca, alçando as sobrancelhas.
p. 28
(...) A fisionomia do
Pastor Wunderlich, porém, permanecia alva, fina e animada, apesar de beber
calmamente um copo depois de outro. p. 30
(...) Achavam-se sentados
em pesadas cadeiras de espaldares altos, comendo coisas boas e pesadas,
servidas numa pesada baixela de prata, e bebendo bons vinhos igualmente
pesados. E, nos intervalos, os presentes conversavam. p 30
(...) As Senhoras
acompanharam esse rumo da conversa por pouco tempo. A Sra. Kröger estava com a
palavra, explicando, da maneira mais apetitosa, qual o melhor método de cozinha
carpas em vinho tinto...
- Depois de cortadas em
pedaços regulares, minha querida, ponha-se na caçarola, com cravos-da-índia,
cebolas e biscoitos. Depois bote tudo no fogo com um pouco de açúcar e uma
colher de manteiga. Mas, pelo amor de Deus, minha querida, não as lave, deixe
todo o sangue dentro... p. 30
(...) - Ei, Christian, não
coma tanto - gritou subitamente o velho Buddenbrook . - A Thilda não faz mal
comer muito; esta menina come por sete homens...
Era verdadeiramente
admirável o apetite que desenvolvia aquela criança magra e taciturna de rosto
comprido e um tanto velho. Ao lhe perguntarem se queria mais um prato de sopa,
respondeu vagarosamente e humildemente: - si...im fa...z fa....vor!
- Do peixe e do presunto escolhera duas vezes dois pedaços com grandes porções
de legumes. Inclinada sobre o prato, míope e diligente, devorava tudo; sem
pressa e sem falar, engolia bocados enormes. (...) comia com o apetite
instintivamente voraz de gente pobre que tem uma mesa franca em casa de
parentes ricos; comia com um sorriso impassível, cobrindo o prato com as boas
coisas, paciente, tenaz, faminta e magrinha. p.31-32
(...) Chegou em duas
grandes travessas de cristal, o pudim de Pletten, uma construção de camadas de
macrones, framboesas, biscoitos e creme de ovos. Na outra ponta da mesa
levantou-se uma chama azulada: as crianças recebiam a sua sobremesa preferida:
um pudim com molho de rum em chamas.
- Thomas, meu filho, por
favor - disse Johann Buddenbrook, tirando do bolso da calça um molho de chaves.
- Na segunda adega, você sabe, na segunda prateleira à direita, duas garrafas
da que ficam atrás do Bordeaux tinto...
E Thomas, que já sabia do
que se tratava, foi correndo e voltou com as garrafas inteiramente cobertas de
pó e de teias de aranha. Mal escoara desse vasilhame pouco vistoso o vinho
malvasia cor de outro, velho e doce, que enchia agora os copinhos de cristal, e
já Wunderlich se levantava. Os convivas emudeceram. O pastor, de copo na mão,
proferiu um brinde eivado de graça (...)
- E agora, meus prezados
amigos, façam-me o favor de esvaziar comigo um copo deste líquido delicioso,
num voto de prosperidade para os nossos venerados anfitriões, no seu magnífico
novo lar... bebamos à prosperidade da família Buddenbrook, dos seus membros
presentes e ausentes... Vivant! p.33
(...) Mandou que Thomas
fosse buscar mais uma garrafa de malvasia, pois errada no cálculo de que duas
seriam suficientes. p. 34
(...) No fim do seu
discurso o pudim de Pletten estava quase consumido e o malvasia para acabar. p.
34
(...) Deixou a sala
rapidamente, seguindo a empregada que acabava de servir manteiga, queijo e
frutas. p. 36
(...) Ele mesmo, Friedrich
Grabow, não era daqueles que desdenham os perus recheados. Ainda hoje, o
presunto ao molho de cebolinhas... diabo, como estava delicioso!... e depois -
já quase sem fôlego - esse pudim de Pletten... macrones, framboesas e creme de
ovos, sim senhor... p. 37
(...) No salão há charutos
para quem quiser e um cafezinho para todo mundo, e, se minha mulher for
generosa, teremos também um copinho de licor... p. 38
Thomas Mann em "Os Buddenbrook", Editora Nova Fronteira